Novo Movimento Surrealista de Lisboa
Foi dia 7, ao anoitecer, que o meu coração explodiu de um orgulho imenso, daqueles orgulhos que só se sentem por aqueles que nos são mais queridos e que sabemos terem em si um talento tal, que só uma bofetada não chegaria caso o encontrássemos desperdiçado e atirado ao não-futuro.
O Novo Movimento Surrealista de Lisboa, pela mão dura do meu grande amigo-irmão João Revolução, abraçado pela Liberdade S.A., tomou conta do olhar e do sobressalto cardíaco de quem não podia perder um momento que não foi só de surrealismo: foi de teatro, foi de força, foi de rítmica-sarcástica, foi de pura poesia activista e fraturante... não, um momento... foi de amor, antes de mais nada.
Se nos recordamos dos nossos grandes amores poéticos, como Cesariny, Negreiros, O'Neill, fácil é compreender o quanto perdemos com os seus desaparecimentos - e o quanto, desde então, que nos faz falta enquanto identidade, recuperarmos a revolta agridoce do lirismo do nosso amado e oculto surrealismo português.
Com planos e datas marcadas para percorrer alguns emblemáticos espaços lisboetas, com performances que primam pelo improviso - tão teatral quanto a própria vida despida de artificios - este Novo Movimento, terá uma apresentação completa, em modo longa-metragem.
Se cada dentada sabe a tão pouco, o culminar será, certamente, o epiteto explosivo desta malta tão talentosa, que tanto merece espaço e ser vista.
O João Revolução, esse sacana que escreve como quem morde, que escreve com a puta da alma toda é, em ele mesmo, a fluência do cansaço que está sempre presente em qualquer revolução: que nasce desse cansaço lento e violento de um grito que peca apenas pela demora.
Se o nosso amado Andre Breton, em 1924 nos ofereceu o seu delicioso Manifesto Surrealista, hoje é hora do lobo para o Novo Movimento Surrealista de Lisboa, que faz vénias aos velhos lobos e lhes bebe a sede da mudança, oferecendo de volta esta humilde e potente ode - com o João Revolução, que eu tanto odeio por tanto amar, sabemos que não estão esquecidos, que a memória descritiva de cada um de nós, que lhes sentem tanta falta, tem tatuada a memória intelectual e sensitiva deles: os Grandes.
Se me permitem, vou ser sincero.
Afirmas, amigo-irmão, Revolução - desconheces que em ti não há outra medida senão essa: a da sinceridade perante a vida - porque vives no mundo inteiro, e os outros vivem no mundo deles - és abrangente e sabes do que falas, quando dizes que o retrato dos escritores é frequente e ordinário. a crueldade de saberes que o futuro e o dia de amanhã são coisas diferentes, e que podes ter futuro sem teres amanhã, e que amanhã poucas ou nenhumas vezes comporta a ideia de futuro.
O que me valeu a instrospecção, até concursos de poesia ganhei. Como é que se ganha uma merda destas?
Aquele sorriso. Mas, atenção, que a tua supra-sinceridade-absoluta-e-irresoluta não é à prova de bala, senão, olha para isto: Sou poeta com cada vez menos frequência - agora a gargalhada é absoluta: nem que quisesses, seu patife! Que a poesia é coisa que te corre nas veias todinhas, e numa década inteirinha nunca te vi dizer senão poesia.
Coitado do Àlvaro de campos, diz o Cesariny São os planos dos comunistas, diz o cidadão mediático Mais duas imperiais, diz a minha fiel amiga - sê-lo ou não, pouco importa, mas serei sempre fiel, e amiga, e rude. Dir-te-ei sempre, meu cabrão, que és mais que isso tudo que tens aí dentro, e que o teu Novo Movimento Surrealista não de Lisboa, é teu - e por ser teu, desculpa lá qualquer coisa, é de todos nós, os sedentos dessa porra toda que escorre dos dedos de quem sente assim, de forma diferente, e já tem sempre medo de ter mais força para não desistir do que para desistir, porque se não desistimos: merda! Seremos ultrajados e maldizidos para toda a nossa infantil eternidade... Muito cuidado com os tiques semi decadentes! Cuidadinho meu amigo.
Vá. Chega. O Novo Movimento Surrealista de Lisboa está aqui em casa - é-nos natural como a sede.
Deixa lá filho. Amanhã vai ser melhor. Deixa lá querido. Vais ver que isso passa.
Este miúdo vai ser um espectáculo, é tão esperto, tem tanto potencial. Esta criança é uma promessa.
Os anti belos, anti heróis Os velhos lobos, somos nós. Tal como eu repudio ser para o meu filho.
Lá vou eu lançado às expectativas. 32 anos de esperança que amanhã vai ser outro dia e que o silêncio não seja o mais próximo que temos da utopia.
Foto: João Ferreira
Curtain falls. We'll always get away with poetry.